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TEMPO DE ORAR

por avidarimar, em 29.05.15

OU MAIS UM EVANGELHO

 

Em tempo de recolhimento

Urge elevar as nossas preces

E fazê-las chegar ao céu

 

Ergo o olhar

E com estrondo ensurdecedor

Vejo passar um A 320

Carregadinho de tanta gente

Esses sim

Estão bem mais perto dele

Ouvem o sermão

De S Passos aos seus discípulos

Um texto lindo

Em português vernáculo escorreito

Pregado no púlpito de S Bento

Não é preciso programa

E corre de improviso

Importa manter as hostes

Com motivo

E mobilizadas ao primeiro aviso

 

Por cá

As minhas orações

Não abrangem liturgia tão refinada

E a divina inspiração não me invade

Chego até a ser tentado

A recorrer a “pais-nossos bravos”

Dos que

Quando a exposição é tanta

O desgaste acentuado

E a paciência se esgota

Em vez de vapores suaves imaculados

Elevam-se densas nuvens

De um fumo escuro

Impregnado de partículas suspensas

Que são libertadas

E contribuem para a destruição

Da camada do ozono

 

Noutros momentos

Sinto necessidade de me confessar

E declamo o que a consciência

Maltratada mas firme

Me impele a dizer

 

Frente à grade do confessionário

Ao representante dele

“Tive vontade

Muita vontade mesmo

Cheguei a juntar um arsenal bélico

Conjeturei todo o plano

De maltratar os acólitos da Buenos Aires

E de linchar alguns do Caldas

É certo contive-me

Faltou-me a coragem

Mas isso passou-me por esta cabeça”

 

Por detrás da grade

Daquele breu tenebroso

Rasgando o silêncio assustador

Brotou uma voz grossa

Tipo trator a lavrar a terra

Lenta e medida

 

“Ora

Ora

Ora bem

Pois é    Irmão

As tentações são muitas

Os perigos imensos

Mas não lhes podemos ceder espaço

Devemos ser mais fortes

Devemos essa obediência

Ao nosso ser maior

Magnânimo

Que está lá em cima

E eu

Seu representante

Neste reino terreno

Eu próprio

Senti o chamamento arrebatador

De os lixar

Aos mesmos que tu

E alguns

Ficaram lixados comigo

 

Irmão

Em nome da humildade

Reconhecendo a falta de eficácia

Ou se mata ou se morre

Por não teres seguido

O que te ditou a consciência

Até ao que ela te obrigava

Vais oferecer uma vela

Da tua altura

À padroeira da freguesia

A senhora dos entalados”

 

Confissão feita

Sentença lida

Penitência por cumprir

O cheiro da cera ardida

Dá-me comichões graves nas narinas

E vê-la arder acima do meu nariz

Arrepia-me

E é natural que me queime as pestanas

 

Em vez disso

Proponho-me sofrer um verdadeiro vexame

Importa ouvir

O que o prior da capela de S Bento

Inflige nos crentes indefesos

Estabeleço ligação através

Da interioridade espiritual

E a chamada

De valor acrescentado

Estabelece o diálogo

De surdos

Sem quaisquer rodeios

A cândida voz gravada

“Está a ligar para o gabinete do omnipotente

Mais que tudo

Residente de S Bento”

 

Ligeira pausa

Seguida dum menos ligeiro ruído

De quem masca umas pevides

E pedacinhos de amendoins

Que sobraram entre dentes

Percebendo-se o escorrer

Turbulenta queda garganta abaixo

Demora a engolir

“Decerto que é para continuar

A senda do emagrecimento

Iniciada em dois mil e onze

Importa acreditar

Não há outro caminho

É preciso confiança

Se quiser melhor

Vá trabalhar pró Canadá

Ou pra França”

 

Como é meu timbre

E não gostando do responso

Sem nada lhe ter perguntado

Já fora de mim

Em tom irritado

Respondi

Que aquela consciência má

Daqui se vá

E que vá trabalhar pra Massamá

Ou se achar que ainda é perto

Vá a nado

E atravesse o canal do Panamá

E já do outro lado

Desça rápido o Pacífico

Passe ao largo da costa do Chile

Mais abaixo

Quilómetros mais de quatro mil

Se refresque no Antártico

De braços abertos

Por lá permaneça

Sem que nada aconteça

Verticalmente estático

 

Não estava á espera

Não fora avisado

Só agora entendi

Pensava eu de quarenta dias

É uma quaresma de quatro anos

Não há penitência que nos habilite

Definhados pelo jejum

Sulcos sangrados da abstinência

Já não tenho mais paciência

Crucificados é de mais

Estamos todos em morte lenta

Nunca mais chega a ressurreição

E o Judas do irrevogável

O patrono das causas perdidas

Ainda não se enforcou

Só se o Mateus se enganou

 

Aguarda a madrugada

Perto do jardim das oliveiras

Por entre perdidos cavacos

 

Aí próximo

No templo de Belém

Jaz moribundo

Um Pilatos

Não larga a bacia das mãos

Ora assobiando pró lado

Ora pedindo que nos juntemos em comunhão

Que este reino que ele quer divino

Bem precisa

Governo e oposição

Para que a sua ceita

Se perpetue no poder

Mesmo que ele apodreça

A olhar o Tejo

Agarrado à cabeça

 

Mas julgo estarmos

No advento da sua saída

Há um espirito santo a pairar

Que me diz que talvez

Lá por alturas do mês três

Deste próximo ano

Ele se evaporará

Subindo ao céu

Em rarefação

E perpetuar-se-á no vazio

Pelo eclipse total e absoluto

Desaparecendo de vez

E neste mundo agora de trevas

Para sempre brilhará

Nova luz em formação

Qual choque de cometas

Em pleno jardim do rato

 

Invoquemos

E demos graças ao constitucional

Por não permitirem o estrago

Com a TSU

Imploremos a todos os votantes

Que não se deixem embalar

Na treta do superior interesse da nação

 

Intercedo ainda

Junto do altíssimo

Para que esta mesma nação

Deixe de ser mera corja

Se quiserem

Meia dúzia de iluminados

Na detenção de todos os bens terrenos

Pois essa coisa de haver um só

São quatro ou cinco

Donos disto tudo

 

E que esse tudo

Mas não é tudinho

Passe prás mãos da população

Já que

Segundo nos rezam

Somos todos filhos do mesmo pai

Acho estranho mas tá bem

 

No fervor tão elevado das minhas preces

Junto a necessidade premente

De utilizar todo o ferodo do mundo

Para travar a loucura das privatizações

Antes que cheguem as eleições

 

Não posso esquecer nas minhas orações

O pedido ao ser celestial

Para que os políticos da república

Não sejam mero sucedâneo

E o perpetuar dos mesmos clãs

Ao longo de séculos

Mais parecendo a monarquia

Vivendo do poder dinástico

 

Eu sei senhor

Que oração já vai longa

E já estás farto de me ouvir

E a pedir

Nunca ninguém tirou o pé da lama

Eu sei senhor

Que já parece uma ladainha

Com TE-DEUM e missa cantarolada

Ao som das quatro estações

Vivaldi em outras versões

E que recebes pedidos de todos os lados

Mas também sei

senhor

Que tu ajudas os mais aflitos

E tens presente

Uma pitada de justiça

Para quem mais precisa

Mas não de quem mais grita

 

Senhor

Como vedes

Não vos peço nada de material

Palpável

É tudo da mais pura espiritualidade

A começar pela reformazita

Bem jeitosa

Vinha mesmo a calhar

Bendito sejais vós

Que eu cá me fico

Aguardando a preferência dos teus favores

 

Tu

Ser omnipotente

O criador

Autor de um mundo perfeito

Os humanos é que o estragam

Com a tua infinita sabedoria

Puseste o teu filho Jorge em Benfica

O irmão dele é que não gostou muito

Da brincadeira

Por causa dos outros foi crucificado

Andou-se ele a matar

Em nome do pai

Para agora o Jorge

Ter tudo facilitado

E ser ainda o preferido

Até em Alvalade

 

Eu dou graças a ti

Pois foi claramente

Obra tua

A conquista do bi campeonato

E também sei

Sinto-o

Que vais dar uma ajudinha

Na conquista da taça da liga

 

Tu és o justo

Sabeis bem

Porque falo destas coisas

O futebol é o ópio do povo

Mas apenas para consumo interno

Já que temos os cofres vazios

Não

Não estranhes a expressão

Não é só de espírito forte

Que a vida humilde se faz

Também dá jeito alguma comida

Já agora uma pinguita

E se houver qualquer coisita

Que facilmente nos leve às nuvens

A alma sente-se bem

 

Tu próprio

Pelos menos Contaram-me

Que também tens um ligeiro vicio

E eu não quero acreditar que o seja

Disseram-me que tens que meter o dedo

Em todo lado

Vá-se lá saber porquê

Eu acho que se trata mais de um hábito

Adquirido com o passar dos tempos

E lá que é capaz de resolver

algumas carências

Lá isso é capaz

E uma mulher faz muita falta

 

Sabeis melhor que ninguém

Que este povo

Na sua santa

E estúpida ignorância

Revendo-se nos exemplos de sucesso

Dos heróis do pontapé na bola

Atingem o regozijo

E o orgasmo mental

Como se eles próprios

Heróis fossem

 

Tens junto a ti

O primeiro grande exemplo

Sim…

Sim…

Não vale a pena

Esbugalhares os olhos de espanto

Sim        o Eusébio da Silva

Viajou diretamente da catedral

Para o espaço celestial

em Janeiro do passado ano

já lhe reservaram uma suite

ao lado da Amália

já que ele gostava deste fado

Para não falar dos tremoços

 

O quê?

Não está contigo?

Ele que tanto se esforçou

Tantas vezes que jogou injetado

E tu não o acolheste

No teu reino?

Ele bebia?

Bem o avisaram para não se meter com o escocês

Más companhias… é o que dá

Mesmo assim

Merecia um pouco mais

E tu bem o podias ter ajudado

 

Repara

Aquele outro prodígio

O outro que já foi o melhor

Conhecido mundialmente

Um predestinado dos cromos

Aquele que concorreu à fífia

Pois…    esse mesmo

O fruto da figueira

Entrou noutras galáxias

Corre mundo

Até foi visto uma manhã

No parque dos tagus

Ou lá o que é

Oremos para que ele se mantenha

Sempre certinho

No bom caminho

E em belas companhias

Não… não…

Esse está preso

Mas é inocente

E lá por se terem encontrado

O que importa pró caso?

Só más línguas

O quê?

Não quero acreditar

Estás mesmo feitinho com os outros

São todos o mesmo

E eu a pensar

Que ainda se podia confiar em alguém

Até tu…

 

Pronto…

Vamos mudar de tema

Pois esta conversa não ajuda

Eu sei

Tu és o justo

Mas também és o artista

As tuas mãos são perfeitas

E hábeis

 

Fizeste o céu azul cintilante

Onde as nuvens se espraiam

Levando a água

A quem precisa

 

Eu sei

Não é da tua responsabilidade

Algumas enxurradas

Inundações

Que acontecem

Aliás não foste tu que criaste

O sistema de descarga

Do autoclismo

 

Fizeste o mar

Onde os grandes navios se deslocam

Levando comida a quem precisa

Os naufrágios não são obra tua

Pois não és tu que os pilotas

 

Fizeste o sol que nos ilumina

E é a fonte de vida

Da nossa galáxia

Não podes ser responsabilizado

Pelos melanomas

Cada vez mais frequentes

Os parvos e os gentios

É que se expõem demais

 

Criaste o homem à tua imagem

A partir do barro

Qual José Franco

Em Mafra

 

Mas é aqui que se adensa

Uma dúvida

Não sei se é um erro de conceção

Ou se se trata de mais uma falha humana

Não investiguei o necessário

Para que pudesse perceber este facto

 

De todos os povos por ti criados

E tu soubeste colocar-nos

Junto à praia

Mas nestes

A testosterona não mora

No local que é comum

Nós sabemos qual

Não… não…

Não é esse

Está sempre na ponta da língua

Só depois do ato

É que a engole

Tás a var a figura dos meninos

Ajuda-me a perceber

Esta existência

Oremos por eles

Pois deste modo

A natalidade diminuirá

Só tu concederás

A nossa redenção

 

LUMAVITO

28/05/2015

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publicado às 00:25

COISAS DA VIDA

por avidarimar, em 28.05.15

Há coisas que morrem

E mesmo assim matam

Coisa que se sentem

E não têm vida própria

Há coisas que são vida

E ressuscitam

Tantas coisas sentimentos

Mortos pela vida

Há vida em coisas

Que vertem lágrimas e não choram

E a minha dor

É sentir as coisas

que não têm vida

 

A morte é uma coisa

Uma agonia prolongada

Que me dói

Morrendo ainda com vida

Dói-me esta coisa

De viver sem sentir

Que a vida nos esgota

E a coisa tempo passa

Mas não acaba

A morte também não

Vai matando todos os dias

Mais um pouco

No limiar da coisa incógnita

 

LUMAVITO

28/05/2015

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publicado às 12:50

A LUZ DOS SONHOS

por avidarimar, em 25.05.15

Do profundo da escuridão

Almejo a luz que nasce cedo

Do horizonte do mar

Rasgo o azul do céu

Por entre o arvoredo

Encontro o que me seduz

E deixo pra trás

Tudo o que se desvaneceu

E é no sossego da noite

Faço com que o sentido vadio se afoite

E o sonho entre no apogeu

 

LUMAVITO

23/5/2015

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publicado às 23:52

QUERO SER PÁSSARO E VOAR

por avidarimar, em 23.05.15

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Eu quero ser pardal em viagem

Fazer das asas o meu batel

Ao sabor das águas sem paragem

Qual geringonça de papel

 

Quero ver o mundo dos telhados

Poisar em todas as muralhas

Comer o pão aos bocados

Saciar-me dos restos em migalhas

 

Quero pairar livre nas montanhas

Girar por vales cavados sem destino

Livrar-me das pessoas enfadonhas

E com horizonte pequenino

 

Quero ser gaivota junto ao mar

Assistir à faina do pescador

Ser águia pujante ao madrugar

E ser falcão imponente ao sol-pôr

 

Quero ser milhafre a planar

Ser coruja à luz da lua

Quero ser livre e voar

E a minha casa ser a rua

 

Quero ser cotovia e cantar

As melodias da liberdade

Quero ser intérprete no ar

Dos poemas da realidade

 

Quero ser simples no ser

Como o pássaro é a voar

Assisti aos filhos a crescer

E já se deslocam no ar

 

Quero ser um pássaro clandestino

Invadir o espaço aéreo da razão

Fazer da vida o nosso hino

Em completa libertação

 

LUMAVITO

23/05/2015

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publicado às 12:57

GADO

por avidarimar, em 20.05.15

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Não à guerra

Não há guerra

Já não há guerra no Ultramar

E Timor já tem treze anos

Mas todos os dias nos fazem uma guerrilha

Despudorada lenta encapotada

Sem direito a trincheiras

Essas estão do outro lado

São barricadas ocultas

De onde são lançados mísseis ideológicos

Atingem-nos com o estrondo destruidor

Do desgaste quotidiano

 

Em todos os noticiários

Os coletes de força apertados

As facas estão afiadas

Os cutelos apontados

Disfarçados no corredor do matadouro

Foi privatizado

Trabalha vinte e quatro horas por dia

E os bois sangram

As vacas mugidas não dão leite

Vertem uma solução aquosa

Com coágulos de sangue

Os olhos dos cavalos brilham

Do sangue derramado pela esclerótica

As ovelhas berram sangrando

No ruminar ácido do bolo

As cabras parideiras

Têm o amojo vazio enrugado

Os bodes perderam os tomates

Rebentaram de tão entalados

E ainda não entraram no corredor

Vão a caminho

 

Os carniceiros andam à solta

Nós somos o gado a abater

 

Fujam

Fujam todos

E não se deixem prender pelos cornos

Berrem ladrem mordam

Deem-lhes coices

Zurrem e praguejem

Mas não cacarejem

 

De tanto cacarejar

É que eles nos acham galinhas tontas

E só os galos os têm junto à garganta

Cantam muito e fazem pouco

Esgravatam o chão

E os outros querem-nos calar o bico

Mesmo antes de nos estriparem

 

Cheira a passos de coelhos engravatados

reais pragas em ebulição

Às paulinas portas que são das tocas

Que são palácios

Tresanda a sangue podre do poder

Contaminado pela bactéria dos mercados

Que são voláteis

Cheira a vinte e oito de Maio

 

E a Santa Comba

E à pútrida matilha de lobos esfaimados

De vingança dos traços

que a história escreveu

 

Resta-nos fugir para as montanhas

Comer a erva que cresce no mato

Beber a água que resta no leito seco do riacho

Resta-nos resistir bem do alto

Até que apareça

Um presidente que nos ouça

 

LUMAVITO

20/05/2015

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publicado às 19:01

NOÇÕES DE ECONOMIA I

por avidarimar, em 20.05.15

 

OU MERCADO DOS ESPERTOS

 

Os bons bocados não são de quem os faz

Mas sim de quem os come

Se os olhas fixamente

E te perdes no tempo

Não suportas tanta fome

 

Entrar no jogo da economia

É verter mais sangue pela pele

Criando uma anemia

O pão que alimenta a carne

Impregnado em gotas de fel

 

O bolo desenformado do mercado

É do gérmen da semente

O tributo inestimável

Guardada ao passar do arado

Faz parecer bem agradável

 

Para saboreares uma fatia

Além dos ovos açúcar e farinha

Juntar-lhe-ás fermento

O resto é contributo

Saída que se adivinha

 

 

Para o patrão o trabalho enaltece

Apenas paga os juros

Do favor do teu emprego

Vais ficar em apuros

O capital nunca amortece

 

Ainda assim se algum dia

Tentares abater o capital

Nadando braço a braço

Dás o estoiro de cansaço

Antes de atingir o final

 

Nunca saldarás a dívida

Pois o perfil de esperto

Só alguns são bafejados

Não atinge todos os lados

Com o efeito do tacho certo

 

 

O trabalho é como tudo

Se feito diversas vezes

Mais não passa que de vício

Toma o ciclo da rotina

Chamam-lhe os ossos do ofício

 

Não queiras ser dependente

Da rotina do trabalho

É uma questão de saúde

E para tal corrosiva doença

Não há metadona que ajude

 

O curso com mais saída

Neste novo mercado

É o bacharelato em farejo

Quem o tem cheira o teu dinheiro

E não entras no festejo

 

Se virtude é trabalhar

E isso não dá estatuto

Vende gravata e jaquetão

À porta da Assembleia

Essa farpela remedeia

O jeito do charlatão

 

No dia em que lá entrares

E consigas botar discurso

Défice dívida PIB inflação

Serás o senhor sabichão

Muitas pancadinhas nas costas

E um lugar na administração

 

Se não usas de esperteza

Em vez de ires à caça

Mais não és do que presa

Não te armes em pateta

Enterrado entre o mato

Com postura de poeta

 

 

LUMAVITO

19/05/2015

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publicado às 00:26

NAS MARGENS DO RIO

por avidarimar, em 10.05.15

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Apetece-me vaguear pela cidade

Pisar as pedras da calçada

Que serpenteia os nacos de construção

Que se empilham nas margens desta rua

Como se a seguissem até ao cruzamento

Como se o curso da água que corre

Pelos recantos e baixios da faixa

Que nada tem pelo meio da vereda

Se esvaíssem por ali

E segue até ao cais que espera

Impaciente pelas novas

Que chegam das ruas e das estradas

E dos campos

Todos eles para trás desta rua

Que chega a este cais

E que o admira pela frente

Envolta pela grande praça

Que admira espantada

E de olho arregalado

A lisura e secura do líquido em estado horizontal

Que parece que está,

Mas vai deslizando por ali abaixo

Sem que os olhos distraídos que por ali vagueiam

Se apercebam que o que está amorfo

E indiferente aos seus olhos

Segue o curso e o ritmo próprio

Do que não quer ficar por ali.

 

Mexe também indiferente

À presença de quem está

E que por ali vagueia, e fica

E que vai deixando um odor,

Marca de presença de vida

Animal, vegetal

No ar do reino vegetal, animal

 

E imaterial de quem fica

E que pensa

Deixando rasto por ali

E por todos os lados por onde

Passa e permanece.

 

Atirando o olhar para o outro lado do cais

A água passa imperturbável

Ao odor de quem não acompanha o seu passar

Noutra senda, noutro sentir corrente

Com outro afazer

Que não tem a ver com a azáfama dos humanos

E procura outra dimensão que não aquela

De quem lhe aperta a garganta

Entre margens que aparentam aveludadas

E o deixam escapar por entre os seus lábios

Húmidos e embevecidos

Por sentirem aquela humidade

De gente tão distinta como aquela

Que escorre por ali a fora

Como se fossem naturalmente lubrificadas

Para que o líquido escorra naturalmente

Com a paragem marcada para reabastecimento

E viragem para outras paragens.

 

Olho o esforço despendido

Por todas estas forças

Convergentes, mas altamente dissonantes

Nos interesses auto parcelares

Porque esta existência é marcada por instantes próprios

E que chocam facilmente com os interesses coletivos

Que são o polo oposto com o ego umbilical

E atiram com que facilidade

Para o egoísmo exacerbado

Do que é estupidamente marca pessoal

E rasto de fedor incontrolável

Inalado no ar de todos os sere s que o são

E dos que o tentam ser

Seres animados pela energia reativa

Da inveja e do asco

E que, desmontadas, não são mais que bosta petrificada

E que se arrasta por estas ruas que parecem pessoas de bem

e benévolas

Estupefactas pela admiração que lhes dedicam outros seres,

Esses sim, seres diferentes, indiferenciados

Que não têm notoriedade

Nem interesse por se sentirem diferentes

E amados, e arrebatados por outros valores

Que se podem apresentar pela dignidade

De aparecer, e de estar

Por que estar também tem saber

E o saber também se instala

E conquista

Em que se anota com dificuldade de estar, e de ser

Mas continuam a teimar em respirar pela narina

E a olhar pelos olhos esbugalhados

Da admiração espantada

E desenfreada.

 

Gostaria de fazer uma viagem por dentro de todos estes olhos

que olham por dentro. E miram por fora

Vão e veem, sobem e descem

E despem o que é despido

E revestem tudo o que é movido

Revestem com desprezo e indiferença

O que é diferente

E o que é naturalmente parvo e estúpido

Pois que sendo estúpido se torna naturalmente aceitável

Pela hoste que é raça de entendimento animal

E por isso se torna acontecimento banal

E o que é banal é socialmente aceitável

Pelo que de grau de rigor

Sendo aceitável, não é relevante

Pois o aceitável é concordância fraca

Básica e repugnante

 

E pelo cais que desliza da andança

Passa o produto das sociedades

E o suor das pessoas

O dinheiro dos agiotas

O esvoaçar dos pombos

E os ovos moles das gaivotas

Sem que para tal tenha feito

Qualquer esforço de rimar

Os navios acostam impávidos

Aos movimentos dos circulantes

Acomodam-se sempre do mesmo lado da colina

E do mesmo lado dos mesmos

Pois a postura é contínua, repetida

E o cais apara o golpe da batida

Sem disso se queixar

Sem anotar a dor infligida

 

O escorrido do piso

Não é pó não é vapor

Tresanda a ácido

A mijo

Nas pedras maltratadas

Do tráfego dos artigos escondidos

Entalados no contentor

É maldade do humano estupor

Cama aberta sem almofadas

Água branca sem sabor

Escorridas das encostas

Das ideias corcundas anafadas

 

Registo o som do silêncio

Entranhado no borburinho das ideias

Com o timbre da confusão

Gerada no esperma da fantasia

Em uníssono com as vogais da elegância

A voz desgarrada da ilusão

É nada que tudo porfia

E em tudo o que nada alcança

 

Chora lágrimas de cortiça

Granulado de vinho e sangue

Do porco acabado de morrer

Misturado com sal

Beleza retocada e postiça

Vapor de inspiração

E languida capacidade de resignação

 

Mas o rio

O rio corre sempre indiferente

Sem olhar quem passa

nem por quem passa

E segue o seu destino

Alheio às máquinas e geringonças

Que descarregam os navios atracados

E que trazem as especiarias de plástico

Vindas do oriente

E que pululam nas lojas

Que estão abertas todos os dias

Durante cinco anos

Até que se esgote a isenção fiscal

 

Mas é assim que se vive

Ao longo das margens deste rio

Que corre sem cessar

Impávido às quotas leiteiras

E à imposições do limite de produção

Da união europeia

Em troca dos milhões e milhões

Que entraram no bolso de meia dúzia

E o restante dos dez milhões

Está a pagar as favas

E não as come

Para que o curso do rio não se altere

E o rio corra sempre altivo

e indiferente ao desemprego

e à emigração

à pobreza cada vez mais acentuada

à dor de alma instalada pela vergonha

De se sentir mutilado na cidadania

Mero número sem contar pra nada

E arrumado na prateleira da dignidade

 

E o rio

O rio não para

E segue o curso de tantas vidas

Tantas ilusões que se criaram

As esperanças que pairaram por cima das cabeças dos números

Os números que foram relegados para sucessão numérica

Mergulharam na desilusão

E assim se mantém no curso deste destino fadado

De correr sempre para o mesmo lado

Indiferente ao curso dos números.

 

LUMAVITO

10/05/2015

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publicado às 21:22

CÃES VADIOS

por avidarimar, em 10.05.15

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À hora da sesta

Os cães ladram na rua

Certo não é do sol que escalda

Nem tão pouco da luz da lua

 

Um gato foge apressado

Pelos pináculos do muro

Forma um salto pró outro lado

Desaparece mais á frente

Num poiso bem mais seguro

 

É uma paródia canina

De contentes abanam o rabo

Mais um da raça felina

Já se foi dali acossado

Bem pra lá da colina

Porque estão sem trela

Vão ao cheiro na cadela

Pois bem sabe o cão vadio

Que a cadela anda com o cio

 

LUMAVITO

10/05/2015

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publicado às 14:57

EMBARCADIÇO

por avidarimar, em 06.05.15

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Farto de cavar a terra

A enxada era pesada

Um dia partiu

Foi a madrinha

Arranjou-lhe colocação

Foi ser padeiro

No mar alto

 

Dia e noite

Noite e dia

Sempre o forno

O forno sempre quente

O pão saía crestado

A escaldar

A tripulação trabalhava

Dia e noite

E comia pão quente

Todos os dias

 

Nas poucas horas livres

O padeiro dormia

No porão junto ao forno

Falava com o cozinheiro

E com o homem que comandava

A sala das máquinas

Eles comiam a solidão

Do fundo do mar alto

Ao som da zoeira das máquinas

 

O navio pouco parava

Dava volta ao mundo

Às vezes atracava no cais de Alcântara

Às vezes

O padeiro via a mulher

Que ficava em terra

Seca de esperar

Às vezes dormia com ela

E lacrimejava

Sedento de ficar

 

Voltou um dia

À terra que tinha a vinha

E tinha a mulher que esperava

E tinha as filhas

Já crescidas e maduras

 

 

Mas já não cavou mais

Jogava à bola de pau

À malha de ferro

E ao bicho

Atracava ao balcão

Da tasca do Libério

Empinava uns copos

Matava o bicho

 

A meio dum copo saboreado

Estalava a língua

E sussurrava

“Olha olha escuta…

Ouve o que o silêncio diz

As estrelas estão suspensas no céu

A ouvir as cigarras no silêncio

E a lua está brilhante

É um pão árabe perfeito”

 

Afogou a solidão

Levantava ferro à hora da ceia

A cirrose bebeu com ele

E a mulher do padeiro

Todos os dias

De tanto esperar

Ficou seca

O padeiro do mar alto

Não ficou

 

As filhas

Essas…

Têm fotos do pai

Na proa do navio ancorado

Bebem saudade

Do embarcadiço

Que encalhou junto à costa

 

LUMAVITO

06/05/2015

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publicado às 23:33

ATÉ QUANDO

por avidarimar, em 01.05.15

IMG_0038.JPG

 

Na falência dos dias de Abril

Ruidosa irrompe a passarada

Os campos vestem cor primaveril

Nos recantos desponta a vida

Em cada botão uma rosa inventada

 

Neste Abril que já foi quente

Resta agora soturno cinzento

O céu carregado está diferente

Chuviscos           aguaceiros          trovoadas

Triste choro       rotundo lamento

Das nuvens que passam revoltadas

 

Tal o céu              tal o tempo

Estas gentes deslizam abatidas

Rendidas à evidência do momento

Lambendo o sangue das feridas

Enterradas num cego desalento

 

Esse lado atrevido irreverente

Comum em tempos de revolução

Extinguiu-se fez-se em nada

Essa letargia de opinião

Mais parece agonia prolongada

Sem que desperte reação

 

Efémeros sinais reativos

Mais não são

Sem real foco apelativo

Uma agonizante mansidão

Talvez até agente passivo

 

Ou será que as manifestações

De um milhão se esvaziou no tempo

E que com o descartar

Da hipótese de eleições

Em fim de dois mil e catorze

Pôs a nu a chantagem de Belém

Vejam lá a quem isto convém

 

Será então

Um poupar de forças

Por umas quantas quinzenas

Por Setembro e Outubro

Que se aguarda apenas

Para depois sim

Tudo precipitar ao rubro

 

Interrogo-me

Se é preciso expirar

A geração que viveu setenta e quatro

Para emergir espirito de consciência

Nesta geração bem mais culta

Como em peça de teatro

Que trata a aparência

Mas sem reação forte

A quem mais os insulta

 

Sigo com atenção

E à distância

Se mudar com coragem

É a opção deste povo

E à partidária alternância

Quem sabe se continuado engodo

Em vez de nova aragem

 

LUMAVITO

30/04/2015

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publicado às 01:08

POEMA EMALHADO

por avidarimar, em 01.05.15

Se ser poeta é tricotar rima

Cá por mim não sei o que é

Com mão desajeitada   mais de horta

Só assenta em contra pé

A malha sai enrugada e torta

Nada que se olhe com estima

 

Não fosse tal     embirração pura

Fui no encalço do que me move

Dicionário em riste para sabichões

Cruzei-me com nove palavras nove

Não é arte nem arquitetura

Sai malha aos arrepelões

 

Comprima          Deprima              Dízima

Esgrima                                Gravíssima         Ilegítima

Lágrima                Oprima

Reprima              Subestima

 

Das que ao meu sentido

As que mais se adequam

O meu júri elegeu

Cada uma           pior que a primeira

Sem jeito            roça pesada asneira

Envergonhado de mim Homero

O sentido das palavras adultero

 

Cada vez mais deprimido

Se todo o problema sou eu

Não são nove são dez

Não acerto nem uma vez

E a rima não arrima

Sinto-me asno perdido

 

Num gesto de desespero

Puxo a ponta da linha em malha

E a obra desmalha

De disparates                   um chorrilho

Tenho agora à solta

Uma linha tão comprida

Posso fiar em volta

E tecer livre sem gralha

Deixar fluir sem espartilho

Todos os versos da vida

 

LUMAVITO

27/04/2015

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publicado às 00:50

EXPRESSÕES

por avidarimar, em 01.05.15

No espaço do córtex

Brota a imagem

O olhar traça as formas

Dos corpos que se arrastam

Sofridos

Dá-lhes a luz e a cor

Instala-lhes na alma

O som arfado dos gemidos

 

O cinzel esculpe a pedra

Que carrega a vida no tempo

Cede-lhe sombras e relevos

Presta-lhe sorrisos

Dá-lhe os instantes vividos

Regista a força do momento

 

Palpita dormente

A mão do escultor

Segura a febre

De rasgar a pedra adormecida

 

O silêncio…

Esse

Desenterra a dor

Gravada no aurículo esquerdo

Percorre o corpo

Rasga a carne

Calcifica as veias

Chama ténue arrastada

Indelével Entumecida

 

 

LUMAVITO

27/04/2015

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publicado às 00:48


Pretendo abordar diversos temas da vida de um país, em claro desespero de sintonia entre governados e governantes. A forma pretende ser a poesia, com mais preocupação pelo conteúdo da mensagem que pela forma de estilo.

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